Encontro com o ídolo e o “esquecimento” profissional em show de Feira de Santana terminam em perrengue e solidariedade de colega de profissão.
A Fotografia é a Literatura do Olhar, mas o Samba Embalou a Pauta
O sonho de todo fotojornalista esportivo e cultural muitas vezes se resume a dois grandes eventos: a final de um Campeonato Brasileiro com seu time do coração, no caso o Flamengo, e o registro daquele artista que transcende a admiração. Para um profissional de Feira de Santana, esse último desejo tinha nome e sobrenome: Zeca Pagodinho.
Oportunidade que surgiu em uma tarde de domingo, véspera de Micareta, quando a então área verde do Shopping Iguatemi se preparava para receber o sambista, e a pauta chegava pelas mãos do editor Valdomiro Silva, do jornal Tribuna Feirense. A empolgação, contudo, daria lugar a um memorável “perrengue” que misturou paixão de fã e a ética (ou falta dela) da cobertura.
A jornada do fotojornalista começou com o aquecimento de praxe: a tradicional feijoada pré-Micareta de Paulo Noberto, momento de confraternização e alegria que elevou o astral do repórter. Ao chegar ao local do show, porém, o cenário profissional se apresentou com um obstáculo inesperado: a dificuldade em acessar o camarim, monopolizado pelo falecido fotógrafo Sinval.
A credencial não bastava. Foi a memória afetiva e a “carteirada” de berço carioca que abriram as portas. Lembrar da infância no Rio de Janeiro, ao lado de Beto Sem Braço, lendário compositor e parceiro de Zeca Pagodinho, autor do icônico samba-enredo “Bumbum Paticumbum Prugurundum” (Império Serrano, 1982), foi a chave.Ao citar a convivência na feira de Coelho da Rocha e as brigas com os filhos do compositor falecido, a emoção superou a burocracia.
No camarim, o fã venceu o repórter
O encontro com Zeca Pagodinho foi um deleite inesquecível, regado a cervejas, brindes e fotos pessoais, cumprindo o sonho de fã com sobras. No entanto, a alegria do camarim, somada a algumas latinhas consumidas na área do público, custou a pauta. Ao som contagiante de Zeca, Tito esqueceu a missão jornalística de cobrir o show, as fotos do palco e do público, e mergulhou no samba. Na manhã seguinte, a ressaca de “bebidas e felicidades” culminou na inevitável cobrança de Valdomiro Silva.
A salvação profissional veio da solidariedade
Desesperado e com medo da demissão, o repórter fotográfico lembrou-se do colega Gledson Santos, do jornal Folha do Estado, que estava no evento. Um telefonema resolveu o problema: as fotos do show foram gentilmente cedidas, garantindo a cobertura para o Tribuna Feirense.
A anedota de bastidores, que sublinha a máxima de que “o fotojornalismo é a forma de registrar os fatos sem interferir no acontecimento”, acabou por mostrar o lado humano e passional da profissão, ilustrando que, por vezes, a arte de “deixar a vida me levar” se sobrepõe à obrigação de pautar.









