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quinta-feira, 21 novembro, 24
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A peleja dos “marreteiros” contra os “pexotes” na Sales Barbosa

Por André Pomponet

As lembranças são dos anos 1980. Naquele tempo a Sales Barbosa não devia ser tão movimentada. Mas, menino, supunha que o ir-e-vir era intenso, compararia hoje ao da Avenida Paulista, ao da Avenida Presidente Vargas, no centro do Rio de Janeiro. Via-me desnorteado observando o mundo de baixo, mulheres e homens passando apressados, numa vertigem.
Deduzo que não era assim, as sensações de menino amplificam tudo. Inclusive porque havia um canteiro bem no meio do calçadão, as barracas dos camelôs ainda não haviam se irradiado por ali. No canteiro não havia flores, só a terra morta e pálida sobre a qual despejavam-se palitos de picolé, bitucas de cigarro, cascas de laranjas, espigas de milhos devorados.
Às portas das lojas comerciários e comerciantes aguardavam a clientela, pacientes. A cidade apenas começava a se expandir, o trânsito era tranquilo e boa parte da população residia dentro do Anel de Contorno. Mas algo emprestava tensão àquele pacato centro comercial: os “marreteiros”.
Eles chegavam apressados e montavam o palco: uma caixa de papelão sobre um tamborete, três pequenas formas de alumínio e uma bola de gude que alguns envolviam em veludo. Daí começavam o pregão, chamando a clientela, os incautos que apostariam seus magros trocados naquele jogo viciado.
Mãos agilíssimas moviam as formas, a fala ininterrupta – quase sempre aos berros – cobrava do apostador uma definição, a indicação da forma sob a qual repousava a bola. Dedos hesitantes ou firmes – isso aí dependia do temperamento do apostador – indicavam a forma escolhida. Quase sempre a bola não estava ali. Se estava, sumia num rápido movimento de dedos.
Em volta aglomerava-se, às segundas-feiras, uma plateia de tabaréus, os chapéus destacando-se. Tudo era sempre muito rápido, os “marreteiros” olhando em volta, atentos à chegada da polícia. Qualquer alarme, recolhiam seus apetrechos e desapareciam pelos becos estreitos, os passos apressados.
– São os marreteiros – Explicou meu pai, um dia, riso nos lábios, quando indaguei o que significava tudo aquilo.
Os “marreteiros” enganavam os apostadores – os “pexotes” – escondendo as bolas aveludadas entre os dedos com gestos de prestidigitação. Eram velozes, mãos mais velozes que os olhos dos “pexotes”. Em volta havia, também, os “esparros”. Eram os falsos apostadores – sócios no embuste – que simulavam ganhos para instigar os incautos.
Aquilo se perpetuou durante algum tempo. Montavam a banca sempre em dia de movimento, sem regularidade ou lugar fixo: surgia no Lambe-Lambe, na Praça dos Remédios, até na Marechal Deodoro. Creio que, com o tempo, o golpe foi se tornando mais conhecido e os “pexotes” escassearam. O crime se tornou também mais imediatista e violento, os assaltos a mão armada se impuseram.
Isso não significa, porém, que “marreteiros” e “pexotes” desapareceram de todo. Diria até que ressurgiram com muita força nos últimos tempos, com a proliferação dos jogos de azar pelo país. Modernizaram-se, migraram para o universo digital. Os “pexotes” seguem sendo tratados como apostadores; os “marreteiros” viraram CEO de casas de apostas, influencers, rifeiros.
No fundo, a patifaria segue a mesma. Mas que hoje ganhou glamour, isso é inegável…

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