Antes de falar do 3º mandato de Lula, e para melhor entendimento deste escrito, faz-se necessário rememorar alguns feitos dos governos Lula I e II. De acordo com a história política recente do Brasil, os Governos Lula I e II vão de 1º de janeiro de 2003 a 31 de dezembro de 2010. Em sua quarta candidatura para o cargo de presidente da República do Brasil (Lula havia sido candidato nas eleições presidenciais de 1989, 1994 e 1998), em outubro de 2002 foi eleito o primeiro ex-operário de orientação socialista a assumir a Presidência da República. Na oportunidade, Lula derrotou o candidato do PSDB, José Serra, com 61% dos votos válidos, em segundo turno, e conquistou seu primeiro mandato.
Como benfeitorias do primeiro mandato do Governo Lula (2003 a 2006) há que se destacar o controle da inflação (caiu de 12,53% em finais do governo FHC para 3,14 no final do primeiro mandato de Lula) e a estabilidade do Real, medidas importantíssimas e que deram credibilidade ao governo; crescimento médio de 4% ao ano do PIB brasileiro; consolidação de programas de transferência de renda, a exemplo do Programa Bolsa Família que permitiu a redução da pobreza e das desigualdades sociais no país; crescimento da renda per capita do brasileiro. A democratização do acesso à escola em todos os níveis e em todo território brasileiro; criação de universidades e institutos federais são destaques do primeiro mandato de Lula, entre tantas outras benfeitorias.
Após derrotar no segundo turno o candidato, também do PSDB, Geraldo Alckmin, obtendo mais de 60% dos votos válidos contra 39,17% de seu adversário, Lula é reeleito para o segundo mandato (2007 a 2010). Dentre os principais destaques desse período fazemos referência à permissão para que universidades privadas crescessem com a criação de programas de financiamento de bolsas públicas em universidades particulares, vide Prouni (Programa Universidade para Todos) criado em 2005; criação, em 2007, do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) com o fim de incrementar as infraestruturas do país; também em 2007 foi criado o Fundeb, em substituição ao Fundef; em 2009 foi criado o Sisu.
Na política internacional o Brasil se destacou, vide participação em Fóruns internacionais como Davos e o G-20; agenda de cooperação com países como a China, Índia, Rússia e África do Sul, que resultou na aliança econômica BRICS; destaque para o estreitamento das relações internacionais, sobretudo com países vizinhos da América do Sul, além de países africanos e de outros continentes.
Como na vida nem sempre tudo são flores, foi no segundo mandato que o Governo Lula se utilizou, sic, do sistema de pagamentos ilícitos para garantir o apoio dos deputados e senadores nas votações de leis e emendas favoráveis ao governo, o Mensalão. Episódio que abalou o segundo mandato de Lula, considerado esquema de corrupção, o Mensalão não foi suficiente para dar cabo da popularidade de Lula que terminou o segundo mandato com aprovação popular recorde de 83%, segundo Datafolha de 19 de dezembro de 2010. Lula ainda conseguiu fazer seu sucessor, ou melhor, sua sucessora, tendo sido eleita em outubro daquele ano, derrotando José Serra (PSDB), em segundo turno, com 56,05% dos votos válidos, a primeira mulher presidenta da história do Brasil, ministra do Governo Lula, Dilma Roussef (PT).
O tempo passou, assim como se passaram os dois mandatos de Dilma Roussef/Michel Temer (MDB), os quatro anos do Governo Bolsonaro e chegamos ao 3º mandato de Lula. A nosso ver, a chegada de Lula ao poder pela terceira vez e a montagem deste Governo Lula foi, num primeiro momento, sinal de uma mudança na política, na ética e, principalmente mudança nos rumos e riscos de uma ruptura no cenário do regime democrático que o Brasil ‘parecia’ correr. Era necessário retomar os princípios de uma normalidade que gerasse a paz e o bem-estar da sociedade brasileira, inicialmente. Bem-estar lastreado na teoria econômica, onde os recursos escassos sejam mais bem distribuídos no sentido de atender necessidades humanas, nunca do interesse de poucos apadrinhados.
Mesmo com todas as dificuldades para a realização das eleições de 2022, as ameaças veladas ou não, a divulgação em massa de Fake News e o uso da máquina estatal para a manutenção do presidente em exercício à época (2022), o povo brasileiro, ainda que ‘ameaçado e coagido’, vide ação de prepostos da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e seu comandante da época, ainda assim, o povo brasileiro votou e mudou uma realidade que poderia ter efeitos irreversíveis aos princípios democráticos.
Salvo melhor juízo, antes da chegada de Lula III existia um cenário de descrença para os menos favorecidos, que viam estampados nas manchetes da mídia nacional muito mais a força do agronegócio e do armamento da população – cujo objetivo visava preparar a população para uma possível ‘ameaça do comunismo’ (risos) -, do que para o mercado de trabalho, para a progressão social. Sim. Isso é fato. Basta um pouco mais de leitura, de busca da informação correta e de interpretação coerente dos fatos, do que vivemos nos últimos quatro anos e fica fácil entender do que se está falando.
Bem, Lula venceu. E durante a montagem do governo surge do “lado de cá” o primeiro questionamento: como governar sem a maioria no Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado Federal?) A formação de um ministério ‘amarrado’ aos diversos partidos políticos, alguns de apoio duvidoso, mas necessário; a distribuição de cargos ao tão “temido e condenado”, mas sempre disposto a apoiar quem está no poder em troca de algumas benesses, Centrão […] foram algumas arrumações iniciais que Lula e sua equipe teve de enfrentar para montar o chamado Governo Lula III.
A título de conhecimento, é bom lembrar que, na política do Brasil, o termo Centrão faz referência a um conjunto de partidos políticos que compuseram uma aliança informal durante a Assembleia Constituinte de 1987 com o objetivo de implementar no texto da Constituição as propostas ligadas ao Presidente da República, José Sarney (PMDB na época), e combater a linha política progressista defendida pelo Presidente da Assembleia Constituinte, Ulysses Guimarães (também PMDB). O atual Centrão envolve o Progressistas; Republicanos; Partido Liberal; Partido Trabalhista Brasileiro e Patriota (agora fundidos); Movimento Democrático Brasileiro; União Brasil; Podemos; e Partido Social Democrático. Grupo de partidos políticos cujos desejos são “insaciáveis” pela máquina pública, independente de quem esteja no poder.
Seja como for, mesmo com todas as dificuldades relatadas, sobretudo na montagem do terceiro mandato de Lula, as melhorias alcançadas neste governo nos indicadores sociais e econômicos; na implementação de programas e benefícios à população; na retomada de obras de infraestruturas que estavam paradas; retomada do Programa Minha Casa Minha Vida e do Programa Mais Médicos; retomada do Pacto Federativo; do relançamento do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) e do Combate ao Racismo com a promulgação da Lei nº 14.532/2023, que equipara a injúria racial ao crime de racismo; da promulgação da Lei de Igualdade Salarial e Remuneratória entre Mulheres e Homens que exerçam a mesma função; da recuperação do prestígio do Brasil no que tange à Política Externa; entre outras ações, enfim. Tudo isso não parece ter refletido na melhoria dos níveis de aceitação do atual Governo Lula.
De acordo com o site https://www.gazetadopovo.com.br em matéria de 2 de maio pp, “Pela primeira vez desde o início do mandato, a taxa de desaprovação do governo Lula superou numericamente o índice de aprovação”. Segundo um levantamento do PoderData, o governo Lula é desaprovado por 47% dos eleitores e aprovado por 45%. A considerar os índices de Lula no final do segundo mandato (83% de aprovação) e os índices atuais, segundo esta pesquisa, respeitadas as características de cada período, há que se questionar: o que realmente está por trás dessa fraca aceitação?
Por fim, deixamos a seguir algumas possíveis reflexões/questionamentos: a) – reflexo dos desgastes oriundos de pronunciamentos intempestivos e mal colocados em momentos especiais? b) – desgastes direcionados pelas bancadas de oposição? c) – falta de ações mais contundentes e expositivas dos membros do Governo? d) – ação ineficaz do governo no que se refere à mídia? Ou seja, mídia sem contundência, sem objetividade ao público que mais opina. e) – falta de obras e ações de impacto para a população? f) – os acordos necessários não têm surtido o efeito esperado? Ou o quadro ministerial precisa urgentemente de ampla reforma?
Fato é que as eleições municipais se aproximam e o presidente Lula e o PT – ora apoiado por um ou por outro partido, ora em lados opostos nos pouco mais de cinco mil e quinhentos municípios Brasil afora -, vão querer eleger candidatos(as) a prefeito(a) em outubro próximo. Aqui ficará a pergunta final deste escrito: Será que mesmo tendo desempenho considerado ótimo e bom, mas com aceitação não tão boa assim, o Governo Lula poderá refletir negativamente para o Partido dos Trabalhadores nas eleições municipais de 2024? Daqui a quatro meses o Brasil saberá.
Por Pedro Torres Filho – Engenheiro Agrônomo
Carlos Alberto – Professor e Radialista