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sábado, 5 outubro, 24
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Diálogo da dor

Um texto para a gente pensar. Se toda política tem suas patologias, a política brasileira atual é um pacote patológico. O texto do amigo de Moïse, assassinado brutalmente no Rio de Janeiro, é um convite para abrirmos o ouvido do coração (a respiração do amor).
– Quem te matou?
– Quem me matou foi o Brasil.
– Como assim?
– Somos migrantes, fugimos, mas na fuga tentamos buscar vida. No começo foi difícil, mas depois consegui um emprego, simples, mas parecia bom.
A morte me aguardava. No solo que eu achava amigo, a morte me aguardava. Fui espancado até à morte num quiosque, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro.
Há muita violência. Muita agressividade contra migrantes, especialmente se somos negros, africanos então…
Meu cadáver foi agredido, roubaram meus órgãos no hospital.
– Como se explica esse ódio todo?
– Não fui morto por dois ou três.
Me matou foi o Brasil. Seu ar contaminado de ódio.
O horror que rasteja nas ruas, o racismo nas veias do sistema, a fúria da discórdia e das mentiras de um desgoverno que só aumenta a violência e a morte.
Quem me matou foi o Brasil.
Que cego não viu que eu só queria meu ganha-pão. Busquei realizar meu sonho, mas me jogaram numa guerra entre pobres.
Fui cobrar meus direitos, me espancaram até à morte. Morri porque fiz questão de sobreviver.
Quem me tirou a vida foi uma sociedade cínica voltada ao enriquecimento dos ricos, ao consumo desenfreado, ao lucro custe o que custar.
Quem me matou foi a exclusão social. Minha e dos meus assassinos.
Eu não queria muito…
…mas já que me mataram quero participar da salvação dos outros migrantes, negros, pobres. Que minha morte possa ser um grito de denúncia.

Fui embora do Congo, minha pátria. Fui obrigado pela violência a buscar outro lugar.
Minha esperança achou o Brasil.
Queria ganhar meu pão, para minha família viver em paz.
Morri, porque tentei sobreviver.

(Sou Sergio Ricciuto Conte, sou migrante e quero gritar o grito de Moïse Kabagambe, 24 anos, migrante refugiado assassinado pela crueldade brasileira em 2022.)

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